quinta-feira, outubro 07, 2010

VOCÊ É O QUE VOCÊ COME !

Quando o francês Jean Anthelme Brillat-Savarin cunhou, em 1825, a expressão "diga-me o que comes e eu te direi o que és", referia-se, sobretudo, aos prazeres de uma boa refeição. Em seu tratado de gastronomia A Fisiologia do Gosto, a primeira obra sobre a relação do homem com a comida, ele dizia que a elaboração de um novo prato causava mais felicidade à espécie humana do que a descoberta de uma estrela. Pouco mais de um século depois, na década de 1950, o sabor de uma boa refeição ganhou um tempero de culpa com a descoberta de que a gordura, em excesso, trazia malefícios à saúde. De lá para cá, uma série de estudos vem contribuindo para medicalizar o pão (e a carne, e a massa, e o doce) nosso de cada dia. Para o bem e para o mal. Alguns alimentos passaram a ser vistos como venenos e outros, como remédios. Entre os dois extremos, está você, fazendo a conta de quantas calorias vai ingerir no almoço, imaginando se suas artérias entupirão de vez com a feijoada programada para o sábado e pensando se, afinal de contas, não seria melhor evitar beber o quinto copo de vinho tinto da semana. É claro que as descobertas de médicos nutrólogos e nutricionistas são para ser levadas a sério. Mas não é igualmente evidente que elas não devem servir para criar neuroses. Você é, sim, o que você come – desde que entenda que, quando nos sentamos à mesa, o fazemos por motivos que vão além da nutrição pura e simples. Entre eles, degustar iguarias, compartilhar um grande momento com os amigos, participar de rituais e cerimônias familiares e até explorar novas culturas (mesmo que isso signifique não ultrapassar os limites de um frango xadrez). Tudo isso se perde quando você começa a encarar uma refeição como uma ida à farmácia. Qual a saída? Ter uma dieta equilibrada – em qualidade e quantidade. Tão equilibrada que lhe dê a chance de, vez por outra, cometer alguns "crimes" nutricionais. "A manutenção da saúde deve ser uma conseqüência, e não o único objetivo do ato de comer bem", diz o americano Michael Pollan, autor do livro In Defense of Food (Em Defesa da Comida), que está na lista dos mais vendidos do jornal The New York Times.
Os refrigerantes, as batatas fritas, os hambúrgueres... Se eles não fossem tão gostosos, não teriam ganhado o planeta. Já as frutas, as verduras, os legumes... Bem, a verdade nua e crua (ou cozida, como queira) é que são alimentos difíceis de engolir para oito em cada dez pessoas (e para dez em cada dez crianças). Pesquisadores da Universidade de Oxford, na Inglaterra, desvendaram os mecanismos cerebrais que tornam uma fritura mais apetitosa do que um rabanete. Eles descobriram que as comidas gordurosas ativam uma região cerebral conhecida como córtex cingulado, a mesma que se acende quando recebemos um carinho ou sentimos o cheiro de um perfume.
Se ainda não veio à sua cabeça a expressão, aqui está ela: bom senso. Pois é, nesse caso não dá para variar. E bom senso significa não exagerar nem no consumo nem na privação. Quer um exemplo? A exclusão de carne vermelha da dieta é responsável por carências de ferro e vitamina B12, nutrientes fundamentais para o organismo. Mais: de nada adianta seguir cegamente dietas como a japonesa e a mediterrânea, tidas como as mais saudáveis, sem levar em conta que você não vive no Japão ou às margens do Mediterrâneo. Uma dieta para ser equilibrada e prazerosa tem de se combinar ao ambiente em que se vive e à genética de cada um. Coma de tudo um pouco e tente transformar o ato de comer numa experiência mais agradável do que se restringir a uma porção de brócolis ou se entupir de frituras. De vez em quando, dá vontade de comer um hambúrguer? Não se prive desse prazer. Coma com calma, sem tanta gordura pingando no prato. Esforce-se para que pelo menos uma de suas refeições diárias seja uma experiência estética e, com o perdão da palavra, sinestésica. Tente melhorar a apresentação dos pratos, capriche na combinação dos alimentos e no seu colorido. Você dificilmente (e põe difícil nisso) se tornará um Marcel Proust, que escreveu o primeiro romance do monumental Em Busca do Tempo Perdido a partir das evocações proporcionadas por uma madeleine – mas, decerto, será alguém mais saudável e feliz.

 Os alimentos podem
ajudar ou prejudicar sua saúde. Mas não é recomendável
sentar-se à mesa como se vai a uma farmácia ou lançar-se
a excessos como um condenado em sua última refeição.
O prazer do equilíbrio é a chave de tudo



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